OPINIÃO

O último guerrilheiro

por DALMO OLIVEIRA

O desaparecimento de José “Pepe” Mujica encerra um período histórico que se iniciou, provavelmente, com o final da Segunda Guerra mundial. Para entender sua trajetória precisamos antes compreender como e porquê líderes que organizaram os movimentos sociais de Esquerda migraram da estratégia de guerrilhas para as disputas institucionais chegando à Presidência de suas respectivas Repúblicas.

Se expandirmos nosso mapa para a América Central e Caribe poderíamos começar com o que ocorreu em Cuba, no final dos anos 50, quando Fidel Casto assumiu a condição de primeiro-ministro na Ilha. Evidentemente, a história de Mujica (e do Uruguai) são bem diferentes da cubana, pós-Fulgêncio. Até por entender que o Movimento de Libertação Nacional-Tupamaros (MLN-T) se inspirou na revolta da Sierra Maestra.

Pepe possui uma similitude com Mandela, que esteve preso por 27 anos, de 1963 a 1990, tendo sido condenado à prisão perpétua em 1964 por sabotagem e conspiração contra o governo da África do Sul.

Mujica foi preso em 1971 e passou mais de uma década encarcerado, incluindo 14 anos em condições brutais durante a Ditadura civil-militar uruguaia (1973–1985). Foi torturado e mantido em isolamento, tornando-se um símbolo de resistência.

Os Tupamaros surgiram em 1963, com o objetivo de combater a desigualdade social e derrubar o governo uruguaio, considerado autoritário e alinhado às elites econômicas. A guerrilha em que Mujica atuou tinha um modus operandi semelhante aos grupos revolucionários que foram criados no Brasil naquele mesmo período. Suas ações incluíam expropriações de bancos, distribuição de alimentos às comunidades pobres e sequestros de figuras simbólicas.

A história oficial uruguaia conta que Mujica se filiou ao Tupamaro em meados dos anos 1960, tornando-se um membro ativo em operações logísticas e armadas. Ele participou de ações como assaltos a bancos e ocupações de rádios para transmitir mensagens revolucionárias.

 

Mujica foi libertado em 1985 com o início do processo de redemocratização do Uruguai. O Tupamaro abandonou a luta armada e se transformou em um partido político legalizado, o Movimento de Participação Popular (MPP), integrado à Frente Ampla (coalizão de esquerda).

O ex-Presidente adotou a via democrática, elegendo-se deputado (1994), senador (1999), ministro da Pecuária (2005) e, finalmente, Presidente do Uruguai (2010–2015).

Ele ficou conhecido como “o presidente mais pobre do mundo”, vivendo de forma austera, doando a maior parte de seu salário a projetos sociais. Depois da Presidência, Pepe Mujica ainda seria eleito senador novamente.

Mujica se junta ao panteão de grandes líderes da Região, como Salvador Allende (1970-1973) no Chile, Juan Domingo Perón, na Argentina, entre 1946 e 1974, de forte influência progressista. Os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff (2003-2016) também foram decisivos na inspiração de políticas públicas mujicanas, além da experiência na Bolívia de Evo Morales (2006-2019), que implementou reformas em benefício das comunidades indígenas.

O legado de Mujica entrega ao povo uruguaio um exemplo de governança que articula bem-estar social, reparação aos povos originários, redistribuição de renda e desenvolvimento econômico dentro das expectativas globais do capitalismo atual.

Foi um homem sintonizado com seu povo. Crítico da opressão de uma classe social sobre outras. Profundo conhecedor e reformulador das teses marxistas. Não teremos nada igual!!

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